No Dia Mundial da Poesia a minha companhia, de noite e de dia, enviou-me um texto de António Osório. Eu é que fui preguiçosa e só hoje a insiro, com desculpa pelos cortes imperdoáveis:
«(...) “A poesia é ainda possível”? Montale, no discurso em que recebeu o Prémio Nobel de 1975, interroga-se sobre o papel que pode ter “a mais discreta das artes”, num tempo em que “o homem civilizado chegou ao ponto de ter horror de si próprio”. Montale deixou-nos uma palavra de esperança – para a poesia “que surge quase por milagre e parece condensar toda uma época”, “para essa poesia não há morte possível…” Mais de 30 anos passaram. Não haverá agora maiores motivos para se ficar inquieto quanto ao futuro? O mundo actual não é bem pior que o de 1975? [...] Que fazer contra [a] maré negra, contra [a] ocultação da poesia? Infelizmente, ninguém vê hoje o poeta como o via Platão – “uma coisa leve, alada e sagrada”. Os poetas são agora uns estranhos párias, uma espécie de sonhadores que andam nas nuvens. A defesa da poesia cabe aos poetas. Muito têm resistido, têm que resistir mais ainda. A experiência diz-me que as leituras de poesia nas escolas e nas universidades, pelos próprios poetas, o diálogo que têm de estabelecer com os alunos seus ouvintes é uma das melhores formas de humanizar o poeta e de chamar o interesse para a poesia que faz. E não se devem limitar estas leituras ao próprio país… (...) Tão-pouco nos devemos confinar a uma ironia sarcástica contra um mundo cruel. Sem dúvida, a poesia terá de ser um “refúgio” contra a voragem tecnocrática, contra o desrespeito pela beleza do mundo, contra a destruição da paisagem. Os seus são os valores da vida, a poesia é, como Croce sempre defendeu, a “palavra cósmica”, uma forma de não se submeter, mas de se indignar, de estar ao lado dos humilhados, uma afirmação humanista. Retenhamos estas palavras de Rainer Maria Rilke, nas suas “Cartas a um jovem Poeta”: “ser artista é amanhecer como as árvores, que não duvidam da própria seiva e que enfrentam tranquilas as tempestades da Primavera, sem recear que o Verão não chegue”. Teremos de ser como elas, que não põem em causa a própria seiva e que resistem às tempestades da Primavera. Contra o desprezo pela poesia, oponhamos a nossa perseverante defesa. E ofereçamos os nossos livros, com um gesto fraterno.»
(António Osório, Mensagem para o Dia Mundial da Poesia 2010 20.03.10)
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