quarta-feira, 17 de dezembro de 2008

«A abundância das dádivas», de Mário Cláudio

Copiámos descaradamente de um Expresso natalício cuja referência se perdeu - esperando que nos perdoem por se tratar de "fins didácticos" -, um belo texto de Mário Cláudio. Ei-lo:


«Que criança de hoje aceitaria como presentes o ouro, o incenso e a mirra? Nem o filho de um rei, nem o filho de um mago.


A eterna Barbi, sempre à beira de se desfazer da sua última "toilette", e o mais recente jogo da Playstation, repondo até à exaustão os seus lances estratégicos, tomaram o lugar das substâncias que duram, que perfumam o ar e que curam as fraquezas do corpo. Daí que seja cada vez menor o número de adultos que, ao receber as suas prendas natalícias, abraçam a inocência que perderam. Num montão de papéis cintilantes e de laços festivos queda-se a abundância das dádivas que vêm ter connosco, as quais se olham por uma vez com o olhar desencantado e logo se remetem à prateleira dos objectos sem fascínio e sem serventia. Os nossos avós das classes privilegiadas encontravam no sapatinho uma simples laranja e tinham-se com ela suficientemente premiados. Existirá mais perfeita maravilha do que um desses frutos da terra, alumiando a noite de Natal como um balão chinês, e até por isso capaz de nos matar a sede?»



O presente da equipa da Biblioteca da Escola Secundária de Vila Verde a toda a comunidade escolar (com as devidas vénias a Mário Cláudio e a René Magritte)



Ceci est une orange.


Um Natal alternativo

A descrição do Natal em casa do Cavaleiro da Dinamarca é lindíssima. A repetição, quando se trata do afecto da família e dos amigos, das histórias e dos rituais que nos constroem, é sempre boa.
Porém, o rito de dar presentes - que remonta à Antiguidade -, começou, de há um tempo a esta parte, a irritar alguns de nós. Não que não gostemos de dar presentes. O que irrita é a sensação de que andamos ao toque da caixa do comércio. O que aborrece é ver decorações de Natal desde Novembro. O que enerva é a assimilação de amor, carinho e atenção a presentes (e a associação destes a dinheiro). Eu, por exemplo, comecei a fazer bolos e biscoitos e a dá-los no Natal (alguns tinham um aspecto um pouco duvidoso); a escrever histórias da família e a oferecê-las aos tios. Uma vez engendrei, a partir de um conto do Mário Cláudio que um destes dias aqui transcreverei, um presente alternativo: uma caixa com uma história e uma laranja.

Mas agora a P2 do Público de 29 de Novembro veio dar-nos uma ajudinha, mais sistemática do que as minhas tentativas incipientes. Vou tentar resumir:

1. Estabeleçam um limite para o dinheiro que vão gastar: “Menos é mais”. Limitem o número de presentes e o seu valor monetário. Este conselho pode e deve aplicar-se às crianças, cujo limiar de atenção, a partir de um certo número de presentes, fica “embotado”. Mas deve ser aplicado paulatinamente, para o choque não ser tão grande…

2. Unam esforços. Num grupo de amigos ou de familiares, utiliza-se a técnica do "amigo secreto": sorteiam-se os nomes dos destinatários dos presentes. Uma pessoa só dá um presente a uma outra pessoa. Desaconselhável quando no mesmo grupo coexistem os tios Patinhas e os Patacôncios...

3. Pensem "em grande". Façam colectas. Se um(a) fizer dezoito anos, juntam-se e dão um presente mesmo muito bom. No caso dos adultos, a colecta tanto pode servir para adquirir algo útil (um aquecedor) como... uma viagem...

4. Sejam solidários. Dêem tempo ou dinheiro a organizações de caridade. Façam voluntariado.

5. Dêem tempo. Escrevam num cartão: "Quatro horas de babysitting"; "Uma tarde de jardinagem"; "Um tabuleiro de roupa passada a ferro" e ofereçam-no à irmã, ao tio solteiro, à amiga atarefada...

6. "Faça você mesmo". Meia dúzia de perguntas a quem estava na Biblioteca e, em dois minutos, já tínhamos uma mão-cheia de sugestões. Ora vejam:

- Doces, bolachas, frascos de compota;
- blocos, cartões e papel de carta personalizados;
- bijutaria, cachecóis;
- molduras
- velas decoradas, arranjos com pinhas
Sempre achei super-romântica a ideia de gravar uma cass… um CD para o/a namorado/a que ia fazer uma viagem longa. Tirando a minha amiga Elisa, que enriqueceu grandemente o meu universo musical dessa maneira, nunca nenhum elemento do sexo masculino me fez isso… nessa perspectiva…



In SCOTT, Jerry; BORGMAN, Jim - Amuado, aluado, tatuado: (coitado...). Lisboa: Gradiva, 2008. p. 11

E não esqueçam o mote da Biblioteca da semana: «Os melhores presentes não se embrulham...»

terça-feira, 16 de dezembro de 2008

Pensadores...


Na biblioteca gostamos não só de contar e ouvir histórias mas também de pensar e questionar.
Aproveitámos o facto do dia mundial da Filosofia se comemorar este ano a 20 de Novembro para, durante o mês, desenvolvemos algumas iniciativas e brincadeiras em torno do “pensamento”.

A professora Beatriz Macedo, a filósofa da equipa, coordenou as actividades e fomos até ao Centro Escolar de Vila Verde onde contou a história da Pimpa, à turma do 3º ano da professora Glória Vinagreiro. Foi uma experiência muito gratificante junto destes pequenos pensadores - pensamos que o sentimento foi mútuo - e ficámos de nos visitar mais vezes ao longo deste ano lectivo.

Na biblioteca foi inaugurada a instalação Os caixotes da Filosofia, elaborados pela turma 11ºC e uma mostra de cartazes sobre problemas lógicos, feitos pelos alunos 11º G.

No dia 20 de Novembro divulgámos a mensagem do Director-Geral da UNESCO, como leitmotiv de discussão em ambiente de sala de aula, e distribuímos pelos alunos e professores de Filosofia autocolante comemorativo. Para o ensino básico os alunos do 11º O, na disciplina de GIBA, fizeram pequenos tangrans com motivos iconográficos em torno da Filosofia que foram distribuídos e trabalhados pelos professores nas turmas. Na sala dos professores lembrámos o dia com uma pequena exposição iconográfica de... Pensadores.

sexta-feira, 12 de dezembro de 2008

A ceia de Natal do Cavaleiro da Dinamarca (continuação)

"(...) na noite de Natal, em frente da enorme lareira, armava-se uma mesa muito comprida onde se sentavam o Cavaleiro, a sua mulher, os seus filhos, os seus parentes e os seus criados.
Os moços da cozinha traziam as grandes peças de carne assada e todos comiam, riam e bebiam vinho quente e cerveja com mel.
Terminada a ceia começava a narração das histórias. Um contava histórias de gnomos e anões. Uma mulher contava a lenda de Tristão e Isolda e um velho de barbas brancas contava a lenda de Alf, rei da Dinamarca, e de Sigurd. Mas as mais belas histórias eram as histórias do Natal, as histórias dos Reis Magos, dos pastores e dos Anjos.
A noite de Natal era igual todos os anos. Sempre a mesma festa, sempre a mesma ceia, sempre as grandes coroas de azevinho penduradas nas portas, sempre as mesmas histórias. Mas as coisas tantas vezes repetidas, e as histórias tantas vezes ouvidas pareciam cada ano mais belas e misteriosas."

quarta-feira, 10 de dezembro de 2008

Les beaux esprits se rencontrent




Tínhamos nós acabado de escrever o texto anterior - que, no fundo, pretendia fazer do mundo um lugar melhor a partir... da Biblioteca da Escola Secundária de Vila Verde (a utopia está viva e recomenda-se) quando lemos, no Público desse mesmo dia (recebemo-lo, infelizmente, com um atraso de, pelo menos, um dia), que uma equipa da Faculdade de Medicina da Universidade de Harvard provou que a felicidade é contagiosa. Reparem bem: "Quando alguém se ri, é normal que as pessoas à sua volta sorriam, pelo menos.", escreve a jornalista Carla Barata. "A felicidade pode espalhar-se pelas nossas redes sociais de uma forma mais impressionante e duradoura."

E o que é - perguntamos nós - a nossa Biblioteca senão uma rede social? E quem é - perguntamos nós - A Sra. Dona Lúcia senão um elemento importante da nossa rede social, que nos sorri, diz bom dia e ajuda a encontrar os livros que às vezes parecem levar sumiço?! Um destes dias ainda alguém vai escrever uma tese acerca da influência da Sra. Dona Lúcia na subida do índice de felicidade no concelho de Vila Verde...

Por isso, já sabem: venham cá, sorriam, peguem num livro e sejam felizes.

Já agora, eis uma lista de livros que, numa altura ou noutra, fizeram felizes alguns dos nossos visitantes de hoje:

- Más maneiras de sermos bons pais, de Eduardo Sá (a sugestão da professora Gracinda Duarte, segundo a qual este livro contribui "(...) para aliviar um pouco o stress dos pais" e reforça a importância da autoridade e responsabilidade na educação dos filhos);
- a Andreia Rêgo sonhava, em menina (e nós suspeitamos que agora também...) com a história da Cinderela;
- a professora Dores Silva está, neste preciso momento (bem, não exactamente neste preciso momento), a ser feliz com o livro Pedaços de ternura de Dorothy Koomson;
- o André Fernandes gostou muito de Um pequeno grande amor da Fátima Lopes;
- a Cristiana Campos mede muito bem o que diz: A Cidade e as Serras, de Eça de Queirós, não a fez feliz, mas conferiu-lhe um sentimento de tranquilidade (a Cristiana promete, não promete?);
- Não há longe nem distância, de Richard Bach, fez, "em seu tempo", a professora Beatriz Macedo feliz (rimou e é verdade. Ficámos, por isso, a saber que Beatriz significa "ser feliz". Vivam as beatrizes!);
- a Patrícia Araújo acha que Um momento inesquecível, de Nicolas Sparks, faz jus ao nome;
- Filhos brilhantes, alunos fascinantes, de Augusto Cury, mudou a vida da Rafaela Ribeiro;
- o professor Filipe Mourão, sempre bem aparecido, escolheu Vinte Poemas de amor e uma canção desesperada, do Pablo Neruda;
- a Joana Garim leu cinco vezes A lua de Joana. Está tudo dito, não está?;
- a professora Margarida Dias, depois de muitas hesitações, pediu para escolher uma autora que a faz feliz. Nós "autorizamos" e até vamos destacar o nome da Marguerite Yourcenar (eu não me chamo Margarida, e concordo com a escolha);
- a Daniela Oliveira não fica propriamente feliz (ainda não terá encontrado o livro "da vida dela"...), mas sente-se bem humorada com "todos os horríveis";
- «A antologia de poemas de Fernando Pessoa», disse, acto contínuo, a professora Cristina Oliveira;
- o José Miguel Sousa gostou muito do Estranho caso do cão morto de Mark Haddon; cá para nós, que ninguém nos lê, fiquei com vontade de o requisitar para as fér... perdão, a interrupção de Natal;
- a Sra. Dona Lúcia comoveu-se com Queimada Viva, de Souad.
E a escriba sentada volta obssessivamente a Mrs. Dalloway da Virginia Woolf.

sexta-feira, 5 de dezembro de 2008

Bom dia, Bonjour, Good morning, Buenos Dias, Buon Giorno, Gutten morgen, Ni Hao

À entrada desta nossa Biblioteca estão uns cartazes que declinam saudações em várias línguas. Estão lá para acolher discretamente os alunos, mas também para lhes lembrar - de forma igualmente discreta - que, ao entrar num local público, devem cumprimentar quem está. Entrem, venham à Biblioteca, sentem-se nos pufes, folheiem jornais, leiam livros, usem os computadores. Mas sorriam-nos e cumprimentem. O dia torna-se mais claro, a Terra gira melhor, o Universo (o nosso, pelo menos) fica um lugar melhor.

Um Natal bem moderninho



O Natal de Tim Burton é, no mínimo, desconcertante:


O Rapaz com Pregos nos Olhos


O Rapaz com Pregos nos Olhos
montou a sua árvore de metal.
Parecia muito estranha
Porque ele realmente via mal.


O Natal Especial do Rapaz Nódoa

Pelo Natal, o Rapaz Nódoa
recebeu um fato novo:
todo limpo e asseado, confortável e engomado.
Mas às duas por três,
brotando copiosas,
aquelas nódoas oleosas
apareceram outra vez.


Boas Festas, Palitinho!

Palitinho constatou que a sua árvore de Natal
tinha melhor aspecto do que ele.


O Rapaz Torresmo

Pelo Natal, o Rapaz Torresmo recebeu
a sua habitual pedra de carvão,
o que muito lhe agradou.

Pelo Natal, o Rapaz Torresmo recebeu
uma pequena prenda em vez da sua habitual pedra de carvão,
o que muito o espantou.

Pelo Natal, o Rapaz Torresmo foi confundido
com a fuligem da chaminé e varrido para a rua.


Não se deixem varrer para a rua. Leiam, leiam muito!
E espreitem A Morte Melancólica do Rapaz Ostra & Outras Histórias de Tim Burton (tradução de Margarida Vale de Gato). As ilustrações são fantásticas...



Morte Melancólica do Rapaz Ostra & Outras Histórias

Um Natal antigo

O preparativos de Natal segundo Sophia de Mello Breynner Andresen:


"(...) a maior festa do ano, a maior alegria, era no Inverno, no centro do Inverno, na noite comprida e fria do Natal.
Então havia sempre grande azáfama em casa do Cavaleiro. Juntava-se a família e vinham amigos e parentes, criados da casa e servos da floresta. E muitos dias antes já o cozinheiro amassava os bolos de mel e trigo, os criados varriam os corredores, e as escadas e todas as coisas eram lavadas, enceradas e polidas. Em cima das portas eram penduradas grandes coroas de azevinho e tudo ficava enfeitado e brilhante. As crianças corriam agitadas de quarto em quarto, subiam e desciam a correr as escadas, faziam recados, ajudavam nos preparativos. Ou então ficavam caladas e, cismando, olhavam pelas janelas a floresta enorme e pensavam na história maravilhosa dos três reis do Oriente que vinham a caminho do presépio de Belém. Lá fora havia gelo, vento, neve. Mas na casa do Cavaleiro havia calor e luz, riso e alegria."

O Cavaleiro da Dinamarca