Há anos e anos que passo pelo Alívio e só este ano me dei conta de que, do ponto de vista arquitectónico, bem... para não ferir susceptibilidades... o Alívio não terá sido concebido num momento de grande inspiração...
O que é engraçado é que nunca me dei conta disso. A razão é mais do que óbvia: é que, antes da poda selvagem a que foi submetido, eu passava e via uma massa de verde que desviava a atenção. Tal como acontece com casas feias, rodeadas de árvores e arbustos e que nos parecem, no seu conjunto, agradáveis. Mas agora, sem esse paliativo, não posso deixar de avaliar o Alívio no seu real esplendor.
Perdoem-me a nostalgia, mas tenho muitas saudades da minha infância, quando, sobretudo no Verão, transpúnhamos alamedas de árvores altas, com uma faixa horizontal de tinta branca. Também tenho saudades dos mecos que pontuavam as estradas, os mais pequenos assinalando (penso eu) cem metros, os maiores um quilómetro. Nestes podíamos ler a distância que nos separava da localidade importante mais próxima, o que, a partir do momento em que aprendíamos a ler, evitava aos nossos pais o aborrecimento de ter de responder pela centésima vez à pergunta: «Ainda falta muito?!» E assim nos entretínhamos, fazíamos contas de cabeça, jogávamos um scrabble inventado a partir das letras das matrículas dos automóveis. Crescíamos calmamente.
O momento melhor, porém, era esse: quando, no calor sufocante e na luz que quase nos cegava, penetrávamos num corredor escuro, vegetal, ligeiramente ondulante. Não tínhamos medo, pois a luz espreitava por entre os interstícios das folhagens e aguardava-nos no fim do túnel. Então, sim, o Alívio devia ser um alívio. Agora é um pedaço de estrada com árvores baixotas e verdes de um lado e árvores baixotas e peladas do outro.
O Alívio está medonho.
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