Acabei ontem de ler um "tijolo" de 900 gramas: Bomarzo, de Manuel Mujica Lainez. Atravessou-se-me à frente há uns tempos, numa daquelas feiras do livro que vendem exemplares um pouco danificados, possivelmente expostos nas livrarias e depois revendidos a um preço módico. Ultimamente, por causa da crise, tenho comprado vários livros assim - e feito boas aquisições.
Este livro é a prova provada da minha incomensurável ignorância. Com efeito, nunca tinha ouvido falar deste escritor argentino, que não só ganhou vários prémios com esta obra, como escreveu o libretto para uma ópera com o mesmo nome, musicada por Alberto Ginastera.
O livro é notável pela sua mestria estilística (a tradução, excelente- do melhor que tenho lido - é de Pedro Tamen), pela erudição histórica, artística, literária; pelo seu conhecimento da natureza humana; e pela contribuição para a teoria literária.
Bomarzo é, também, um livro inquietante. A mim provocou-me uma sensação de desconforto muito próxima da que experimentei ao ler O perfume de Patrick Suskind. A par dessa sensação, porém, há um fascínio pela personagem de Vecino, ou Pier Francesco Orsini, duque de Bomarzo. Encarnação do mal, homem do seu tempo, figura meio histórica, meio ficcionada, o duque não é, a meu ver, o verdadeiro protagonista da história, o qual seria... o castelo de Bomarzo. É pelo seu domínio que o aristocrata comete parte dos seus crimes, é ele que o explica e sustém, é nele que reproduz a sua própria enfermidade. Os jardins de Bomarzo confundem-se com a sua própria biografia, como comenta Vecino:
«Um mundo de imagens e de incógnitas - a minha biografia fantástica - brotou das vísceras da minha terra. Tive de repetir para o descrever as palavras enorme, imenso, gigantesco, colossal, esgotando os sinónimos à saciedade.» Assim, também, este livro.
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