Às vezes sou preguiçosa. Na segunda-feira comemoraram-se (tenho sempre dificuldade em conjugar este verbo, algo jubilatório, com a palavra morte, mas enfim...) cinquenta anos da morte deste escritor português. Deixei pairar o silêncio sobre essa data, quando, na verdade, gosto muito de Aquilino, em particular de A casa grande de Romarigães. Ainda hoje me lembro do fascínio com que, aos quinze ou dezasseis anos, li
«A bolota taluda ficara ali muito quieta, muito bem refastelada em virtude do
próprio peso, enterrada que nem pelouro de batalha depois de passarem carros e
carretas. Que fazer senão deitar-se a dormir?! Dormiu uma hora ou uma vida
inteira, quem sabe?! Um laparoto veio lá de cascos de rolha, rapou a terra, fez
um toural, aliviou-se, e ela ficou por baixo, sufocada sem poder respirar, em
plena escuridão. Estava no fim do fim? Um belisco, e do seu flanco saiu como uma
flecha. Era de luz ou de vida? Era uma fonte ou antes um cântico de ave, de água
corrente, de vagem a estalar com o sol (... )? Era tudo isto, encarnado no fogo
incomburente que lhe lavrava no flanco, verbo que acabou por irradiar do próprio
mistério do seu ser.
Do pinhão, que um pé-de-vento
arrancou da pinha-mãe, e da bolota, que a ave deixou cair no solo, repetido o
acto mil vezes, gerou-se a floresta.»
Nunca o adjectivo telúrico fez tanto sentido...
De acordo com o site do Instituto Camões, de onde extraí a citação,
Aquilino Ribeiro é «um dos romancistas mais fecundos da primeira metade
deste século. Inicia a sua obra em 1913 com os contos de Jardim das
Tormentas e com o romance A Via Sinuosa, 1918, e mantém a qualidade
literária na maioria dos seus textos, publicados com regularidade e êxito junto
do público e da crítica.
Andam Faunos pelos Bosques, 1926, A Casa
Grande de Romarigães, 1957, O Malhadinhas e Quando os Lobos
Uivam, 1958, representam tendências constantes da sua ficção: um
regionalismo que é apego à terra campesina e às suas gentes, sem perder
universalidade nos seus caracteres e descrições; uma ironia terna e complacente
perante os vícios humanos comuns; uma crítica violenta da opressão política e do
fanatismo ideológico, uma atenção inebriada ao pulsar do torrão campestre, tanto
como à vibração sensual do corpo no ser humano.» (http://cvc.instituto-camoes.pt/literatura/aquilino.htm, consultado em 29/5/2013)
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